terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Posso ajudar?



Por forças das circunstâncias, no meu local de trabalho, tenho oportunidade de olhar determinados comportamentos humanos de um ângulo privilegiado. Os jovens, na ânsia de emancipação precoce, são excelentes alvos de análises rápidas, mas falíveis, e eu, como qualquer adulto de horizontes mais latos, entretenho-me a meditar sobre o que os meus olhos vêm.
Há coisinhas miúdas no modo de estar de alguns jovens que me desagradam em absoluto. Mas também recebo ensinamentos de outros, que considero exemplares pelo seu altruísmo. Mesmo nos seus relacionamentos amorosos, as diferenças são notórias – depende do grau de educação e dos exemplos que tomam para si.
Não importa eivar esta croniqueta com lamúrias estéreis, visto que as coisas são o que são, aqui ou na China, e as excepções só podem ser entendidas pela via do obscurantismo, seja ele religioso ou pagão.
Por outro lado, aprendi com o Mestre Fernando Vale uma verdade insofismável: os graus de decadência que a Humanidade atingiu são tão elevadas que o futuro só pode ser melhor – nunca pior do que está!
Poderão parecer um contra-senso os dois últimos parágrafos, mas não creio que falte coerência aos raciocínios de que faço fé: o primeiro é a mera constatação de uma realidade que o segundo reconhece e “imagina ser passível de mudança”; como se processará essa mudança, não se sabe…
Este longo intróito vem a propósito de um pequeno conto onde se procura retratar uma certa inocência implícita (ontem como hoje?), com duas passagens curiosas: a assunção da timidez em certa fase da adolescência (ontem como hoje, apesar de tudo), e o modo “esperto” como o protagonista (eu!) procurou aproximar-se da “sua amada”.

A Mariana trabalhava na Livraria Académica e usava os cabelos compridos.
Perdi o conto às visitas que fiz à livraria, na esperança de ser ela a ouvir os meus pedidos de coisas simples: lápis, borrachas, papel cavalinho, aguarelas...
Quando não estava necessitado de nada, teimava em continuar cliente de leituras, embora curtas. Foi assim que conheci Mário Sá Carneiro, António Botto, Alves Redol e tantos outros autores portugueses
A estratégia era simples: para que a Mariana viesse ter comigo, entrava na loja e ia direitinho à estante das obras menos procuradas. E ela vinha, mesmo depois de se ter apercebido da marosca, com um sorriso malandro.
- Posso ajudar?
Poder, podia, mas a ajuda necessária não tinha nada a ver com esclarecimentos sobre as obras expostas. Talvez se falasse do tempo que fazia lá fora, do single musical em voga ou de qualquer coisa que me fizesse ganhar coragem, eu teria saído do canto da minha timidez e declarava-me... "apaixonado"!
A Mariana foi sempre muito profissional no seu papel de balconista e nunca passou do cumprimento de circunstância e da frase sempre igual:
-Posso ajudar!
Eu, como não tinha asas para voar para outras conversas, fiquei cativo da timidez e ela nunca soube da minha "paixoneta"... adolescente.

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