terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

O derriço



Dou voltas à cabeça e da memória não sai coisa que se veja.
Francamente, isto vai de mal a pior, mas enfim, os neurónios talvez melhorem com mezinha de boticário caseiro. É que há coisas miúdas que não recordo, paciência, mas lá bem no fundo, ainda existe uma vaga ideia de quem foi o meu primeiro derriço…
Assumido o estado psíquico, digo ao que venho: sei de uma canção escrita pelo poeta angolano Viriato da Cruz, musicada pelo Fausto, e interpretada superiormente pelo Sérgio Godinho, a que foi dado o título “O Namoro” em 1976.
O poema leva-nos a um tempo difícil para os namoricos envergonhados. Nessas situações, um pequeno cartão, onde estava escrita uma frase romântica, e num dos cantos, em letras gorda, a palavra NÃO e no outro a palavra SIM, era o meio eficaz para levar ao conhecimento do “amor da nossa vida” as honestas intenções de uma paixão adolescente.
Quando o cartão retornava às mãos do emissor, imagine-se a ansiedade com que se abria o pequeno envelope!
Este método “sofisticado” de pedir namoro caiu em desuso e deu lugar a imaginações mais subtis pouco relevantes para a croniqueta. Hoje, os jovens, não namoram – “curtem”! Os telemóveis substituíram, (com vantagem) os cartões do poeta Viriato, e namorar a “sério” é para os mais velhos, depois de se passar por alguns períodos de “curtição” e de relações mais ou menos intensas com os “amigos coloridos”.Há excepções, obviamente…
Não há comparação possível entre estes dois tempos nem importa esse jogo de memória.
“No outro tempo”, um namoro supunha casório na Igreja, flor de laranjeira e vestido (da noiva) alvo como a neve. Esse período nunca era demasiado longo, por razões óbvias…
Chegados à decisão final, com a bênção dos progenitores e algum dinheiro para os primeiros gastos, arranjava-se casa onde se acomodava o essencial; o resto vinha com o tempo e a disponibilidade económica do jovem casal. E assim se construía o “ninho”, a pulso e a dois, para que fizesse fé o voto de ajuda mútua, na tristeza e na alegria, etc e tal…
“Neste tempo”, o namoro pode ter anos de avanços e recuos, por norma com a intenção (importante!) de se conhecerem feitios e personalidades, e o “ninho”, a ser construído, terá recheio capaz de proporcionar uma vida a dois facilitada no mais pequeno pormenor. Simples!
O modo muito aligeirado com que falo do namoro, sem ter a veleidade de tirar quaisquer conclusões, talvez deixe perceber que, enquanto instituição social, está em crise. Não está, felizmente - continua-se a namorar (ou a “curtir-se”!), consoante os rituais herdados.
Esse tempo ainda é um “tempo de engano” (porque se esconde, por norma, da pessoa amada um ou outro aspecto da personalidade, ou porque se fingem características que não fazem parte dos seus valores morais e intelectuais – sempre na melhor das intenções: não perder a “alma gémea” que se julga ter encontrado).
Apesar de tudo, continua a ser um tempo de encantamento e ilusão, emoções, cedências e sensações únicas…
Quando o “barco do amor” inicia a viagem, acreditamos que o cais do destino será sempre um porto seguro. Mas se o derriço se apaga, o naufrágio é catastrófico.
Dito isto, “namorar é preciso”antes, durante e depois da tempestade.
Haja com quem!

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