quarta-feira, 15 de abril de 2009

Ai coração, coração!


De fonte segura nada se sabe sobre o futuro do SAP de Oliveira do Hospital. Talvez fique tudo como está (improvável!) ou então a responsabilidade (diz-se…) do atendimento nocturno passará pela competência dos serviços da Fundação Aurélio Amaro Diniz. Há quem argumente que o Hospital oferece valências relevantes, logo, a mudança traria benefícios à população...
Seria interessante recuar no tempo e contar a história do nosso Hospital, mas deixemos isso para melhor ocasião, porque o que importa, agora, é saber qual a solução encontrada. Obviamente, nem equaciono a hipótese de ficarmos sem assistência médica durante a noite, mas se tal vier a acontecer, é certo que algumas vidas humanas ficarão perante uma situação de elevado risco, principalmente se se vierem a verificar situações de urgência sem hora marcada – como me sucedeu na noite do passado dia 31.
A minha “estória” é semelhante a tantas outras: o coração achou por bem “ir de férias”, e vai daí “alertou-me” para a necessidade de repouso conveniente.” Partidas” destas não se fazem a ninguém, quanto mais ao dono do dito músculo, que (quase) sempre o estimou, deu-lhe amores e paixões q.b. e andava agora com ele nas palminhas, não fosse cair na esparrela de outra paixoneta…
Vá-se lá saber porquê, cansado de me aturar, atirou-me para o Centro de Saúde de armas e bagagens. Felizmente, o SAP ainda não recebeu guia de marcha (sorte minha!), e a equipa liderada pelo Dr Herdade tratou dos primeiros cuidados com eficiência e competência. Coimbra fica logo ali, a dois passos; na prestimosa e fundamental companhia do Enfermeiro Carlos, a viagem foi “rápida” e, uma vez mais, a sorte esteve comigo: cheguei aos HUC a tempo de tratamento capaz.
Durante o trajecto, viajei pelo mundo dos sonhos fantásticos (?), em tons de cinzento; mais tarde relacionei o “filme” com algumas leituras especulativas (?), interessantes apesar de tudo, imaginação fértil, digo eu, mas devo confessar o espanto por, de um momento para outro, as dores asfixiantes no peito terem desaparecido; veio um tempo, segundos talvez, de sossego maravilhoso, e não fora o chamamento do Carlos, talvez me deixasse ficar por ali!
-Fale comigo! – disse – e abanou-me o braço!
Regressaram as dores e a sensação de sufoco. Quando dei por mim, estava deitado numa marquesa, rodeado por umas quantas pessoas vestidas com batas de cores diferentes.
Os dias que passei na Unidade dos Cuidados Intensivos Coronários foram “óptimos” – nada a dizer do tratamento vip com que fui obsequiado; porém, ficaria de mal com a minha consciência (e o meu coração…) se não trouxesse à ribalta o nome da enfermeira oliveirense Sónia Nunes pela gentileza (à sua competência profissional, e das restantes colegas, nota máxima!) das suas atenções, a lembrar-me a cada momento os “trabalhos de casa”:
- Tem de mudar de vida, descanse mais, alimente-se bem, não faça isto, não faça aquilo…
Respondia a tudo que sim, claro – quem apanha um susto destes (ai coração, coração!) só pode dizer ámen a todas as recomendações.
Entretanto, em Oliveira, o Ricardo Brito vai ao leme dos barcos de ambos, com jeito e algum sacrifício: de manhã nos computadores, ao meio dia de serviço aos cafés, volta à informática, e à noite regressa ao “local do crime”, que é como quem diz, ao barzinho onde me deu a macacoa! Enorme amigo este “filhote”, que adoptei pela via do amor fraterno, vai para sete anos…
Naquele dia, se o João Paiva tivesse sido multado por excesso de velocidade, a responsabilidade era minha - foi o João que me conduziu ao Centro de Saúde num abrir e fechar de olhos. Amigos destes, felizmente tenho mais, muitos mais, e o Ritual deve ser o único bar do mundo onde esses amigos se servem, levantam a loiça, e ainda pagam a conta!!!
A partir de agora, vou preocupar-me mais a sério com o futuro do SAP da minha cidade, não vá o diabo tecê-las e eu ter de ir às pressas para Seia ou Arganil - a sorte também se procura… quando a assistência médica está a dois passos; de outro modo, a viagem é capaz de ter só um sentido.

Seis “pompons” na beira da estrada


Ouvi na rádio que a Câmara Municipal de Arouca, no distrito de Aveiro, está a projectar no terreno uma iniciativa fora do vulgar, tendo em vista dinamizar o turismo rural
Recorro à página oficial da “ANCRA” - Associação Nacional dos Criadores da Raça Arouquesa” e fico a saber que “…as vacas adultas, de manhã são levadas para o monte onde passam todo o dia e só regressam já de noite. Os vitelos ficam na "corte". Mamam antes da vaca sair e quando ela regressa do monte…” .
Portanto, a estória que ouvi de fugida, tem a ver com esta espécie de gado bovino que se alimenta nos baldios da região, mas o que prendeu a minha atenção, foi o pormenor da ideia: qualquer um de nós pode adquirir um animal desta raça (ou mais!), que terá um chip incorporado no dorso de modo a ser localizado com facilidade enquanto vagueia pelos montes. A entidade responsável pelos cuidados dos animais, sedeada no local, a qualquer hora do dia, pode ser contactada pelo proprietário e este, se desejar, pode visitar o seu animal no habitat natural. O dono também pode negociar a vaca com quem entender, mediante certas regras, etc, etc – ouvir as notícias na rádio, a meio, não é o mesmo que saber das ditas pelo jornal, porque, pela leitura, ficamos com a informação por inteiro, podemos voltar atrás, reler…
Interessante, na minha opinião, a iniciativa, quase cópia do que o Jardim Zoológico pratica quando nos decidimos “apadrinhar” determinado animal, contribuindo para o seu sustento; neste caso, a vaca pode ser negociada e é bem possível que apareçam “investidores” interessados no lucro…
Por falar em “apadrinhar” animais (e agora começa outra estória, inspirada na iniciativa da Câmara de Arouca), há uns tempos atrás dei de caras com duas raposas, ainda jovens, penso, que se cruzaram comigo quando ia para casa, noite alta. Apesar de conduzir devagar, diminuí ainda mais a velocidade do meu carro e fiquei a vê-las, por segundos, numa “luta” sem intenções perigosas, digo eu. Terminada a brincadeira, foram à vida, atravessando a estrada. A partir desse dia, pelo menos uma está “à minha espera”, e logo que a luz dos faróis a ilumina, levanta-se, olha para “mim”, e passa para o outro lado, perdendo-se no mato que, por ali, é rasteiro.
Acredito que os progenitores andem por perto, mas como as “nossas relações são pacíficas”, não creio que “aconselhem” os filhotes a mudarem de pouso.
O mesmo “dirão” os esquilos que de quando em vez vejo saltitar nos carvalhos, durante o dia, ou os “Saca Rabos” (espécie de gato bravo) quando procuram caça, coelhos ou javalis desgarrados. De certa forma, são todos meus “afilhados”!
Quantos às perdizes, nem vê-las!
Como posso escolher um dos dois caminhos que tenho à disposição para ir e vir, alterno. Um deles, de curvas bem contadas, talvez umas noventa! Se a paciência é pouca, vou pelo outro - sempre é mais a direito por entre os pinheiros de porte alto.
É neste percurso menos sinuoso que tenho os meus "encontros imediatos", talvez por bordejar, em certa medida o “meu rio” (pobre dele, quase morto). Como os meus “amigos” bichos matam a sede nas águas do Alva, andam por lá, fazem os ninhos nas árvores, ocupam as tocas de uma assoalhada e convivem entre si segundo as regras da mãe Natureza.
Surpresa maior: há dois dias, depois de (mais) uma curva, reparei que estavam uns “pompons” enroscadinhos na berma da estrada. Parei, as bolinhas de pelo ganharam vida e, meio assustadas esconderam-se na valeta pouco profunda. Contei quatro cachorrinhos matizados, entre o branco e o preto, alguns com tons de cinzento no pelo.
No dia seguinte, à hora do almoço, levei-lhes meia dúzia de conchas de sopa – daquela que só a mãe Natália sabe fazer, espessa e saborosa, de fazer crescer água na boca só de olhar!
Então, decidi: como não posso ter uma vaca de raça “Arouquesa” mesmo minha, e como não sou “padrinho” de nenhum animal em cativeiro no Jardim Zoológico”, assumi a responsabilidade de alimentar, pelo menos uma vez por dia, os “meus pompons” - que afinal são seis e não quatro! - mais a mãe, baixota e feia de tão magra, mas que “sorri” abanando o rabo sempre que me vê ; fica especada a olhar os filhotes e é incapaz de se servir um pouco que seja da ração que despejo em recipiente próprio – sirvo-a à parte, “agradece” com o mesmo “sorriso” e, quando volto à estrada, pelo canto do olho vejo que continua de rabito no ar, como se estivesse a dizer adeus.

terça-feira, 14 de abril de 2009

A “crise” de agora e “A arte de Furtar” (Séc. XVII)



O programa Prós e Contras da RTP obriga a um manancial de excelentes raciocínios. Quando o tema vai de encontro às minhas preocupações, fico atento do princípio ao fim.
Como responder à crise? – foi a questão em debate segunda feira passada, dia nove de Março.
Os convidados, todos eles especialistas nas matérias associadas, opinaram, mas dali não saiu, a meu ver, nenhuma ideia brilhante, precisa e concisa, mágica até, capaz de solucionar o problema que toca a todos….a todos, virgula, porque a crise não é como o sol quando nasce! A crise – sejamos justos – é só para alguns, depende! Melhor: cada um tem a sua própria crise, que pode ir da falta de dinheiro à ausência de perspectivas de emprego; sobre outras crises, tão díspares entre si, durante o programa, nenhuma delas mereceu honras de conversa.
Se ficarmos presos às grandes questões da tesouraria, La Palice diria que a crise só atinge…quem tinha milhões e passou a contar tostões! No debate, foi dito que há dificuldades, sim senhor, mas não “…passa disso”, tudo se há-de compor a seu tempo – era um optimista a dizer “coisas”.
Veio outro especialista poetizar a felicidade merecida com a ideia de que, por essa via, todas as soluções estão ao alcance das nossas mãos, mais coisa menos coisa – era um sonhador a tirar a água do capote, na eventual falta de conhecimentos contabilísticos.
Animado, o programa lá foi por minutos bem contados a caminho do fim…
O mundo está de pernas para o ar, sem dúvida, mas não será o tempo de agora que lhe regista o passamento, apesar de todas as crises – nem o Bandarra o previu nas suas profecias! Portanto, a vida continua, com altos e baixos, como as marés…
Será “pecado” badalar a crise e, mesmo assim, encher os estádios de futebol?
O “nosso” Tony Carreira lotou por duas vezes o Pavilhão Atlântico – que se passa com os pecados dos seus leais seguidores? Fico-me pelos exemplos de “Gente Feliz com Lágrimas” (perdoe-se a analogia com a obra de João de Melo) porque das duas uma: ou estes milhares de portugueses, amantes da bola e das cantigas do Tony desconhecem a realidade do País e do resto do mundo, ou então são mesmo uns sortudos e não há crise que lhes chegue, por mais desemprego que possa ser contabilizado pelos sindicatos, despedimentos, etc., etc.
Ainda a crise. Veio parar-me às mãos uma edição gráfica da Gulbenkian, onde se podem ler alguns textos escritos no Século XVII. Um deles, sem nome de autor, intitula-se a “Arte de Furtar”. Ficam os rótulos que encimam alguns capítulos do texto panfletário (?), para merecimento da atenção do leitor: “Como para furtar há arte, que é ciência verdadeira”; “Como a arte de furtar é muito nobre”; “Como os maiores ladrões são os que têm por ofício livrar-nos de outros ladrões”; “Como se furta a título de benefício”, etc.
“… Assim se prova que há arte de furtar; e que esta seja ciência verdadeira é muito mais fácil de provar, ainda que não tenha escola pública, nem doutores graduados que a ensinem em universidade, como têm as outras ciências...” – anotou o escrevinhador, ilustre desconhecido.
Como se fala de crises, bancos sem dinheiro, paraísos fiscais e outras negociatas, o livrinho… nem de propósito, parece ter saído agora do prelo.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Nas asas do sonho, a caminho do Piódão





“Lena”:
Há dias lembrei-te as férias que Agosto coloca no passaporte; este ano, a sugestão do nosso Governo, em nome de todas as crises, é bem clara: vai para fora… cá dentro!
Como o vai/vem das ondas do mar cansa alguns sentidos, e a “tua” serra tem as vertentes pouco íngremes, convidei-te, se bem te lembras, para uma visita ao Piódão, que fica logo ali, do outro lado da “minha”serra.
Se decidires aceitar o convite, ficam garantidos horizontes fascinantes, para lá de todos os montes, precipícios de meter medo e, bem lá no fundo, aldeias inteiras que nem imaginas com vida – mas ela existe, e as pessoas sobrevivem às custas daquilo que a terra dá e pouco mais…
Aconselhava o percurso mais curto; se vieres desses lados, de cima, entras em Coja, segues em frente, sobes para a Cerdeira, continuas a subir sempre… sempre… sempre, e logo vês uma placa: Piódão, para “este lado”, para a esquerda.
Aconselhava, disse, mas desaconselho, porque a estrada está um horror, tens de levar o carro a passo de caracol (o que também não é mau, sempre vês melhor a paisagem, e não arriscas nenhum susto se, em sentido contrário, aparecer pela frente outra viatura).
Mesmo assim, depois deste alerta (a Câmara Municipal de Arganil por certo desconhece a situação em que se encontram os buracos, por isso “sobra” pouca estrada…) se queres, aventura-te. Se vieres com sede de água fresca, a meio da viagem tens a fonte do “Pião”; pára, da mão fazes concha, e bebes até doer a garganta, porque a água chega gelada.
Com a sensibilidade à flor da pele, já deste como boa a minha sugestão, e ainda não chegaste ao alto do Piódão, falta pouco…
De volta à gincana entre os buracos, não te apresses, … um pouco mais e… parece que te deu uma “coisa”: num segundo ficas com o olhar preso naquele amontoado de casas escuras, muito juntinhas – parecem uma só, com muitas dependências!
Stop!!!
Então, não dizia? Ficaste sem palavras perante o panorama incomensurável que vais guardar para todo o sempre no arquivo da memória!
Antes de desceres (a estrada continua ruim, e lá mais abaixo pior ainda por causa de algumas obras - cuida-te!) deves perfilar-te perante a lembrança dos passos de Miguel Torga, que por ali andou e aí se “despediu de Portugal”, “com o protesto do corpo doente pelos safanões tormentosos da longa caminhada…”. A “pedra bruta”, com a frase completa está mesmo aí, à tua frente, depois daquelas urzes, vês?
Continua a viagem devagar; se decidires pernoitar, faz a reserva na pousada que fica à tua direita – dizem que o serviço é excelente, nada me diz que o não seja; garanto, isso sim, o silêncio dos montes!
Finalmente, o largo da Igreja! Vê como o monumento tem o branco de todas as purezas, como o gostar de quem gosta do que é puro, como o ar que respiras na “minha” serra!
A partir daqui, não te conduzo os passos, mas vai por mim dar uma palavrinha ao senhor Lourenço, que tem uma venda com o seu nome. Mas só uma palavrinha; se for com a tua cara (é que vai mesmo, sendo tu como és…) não te larga com estórias – mais de mil! - que diz ter escritas em setenta agendas! Já agora, dá um salto ao “Solar dos Pachecos” e prova um dos deliciosos licores que tens à disposição, mas aquilo trepa, se abusares, já sabes...
No regresso, sugiro outra estrada com melhor piso, em direcção a Vide. É mais longe, mas compensa.
A meio caminho, encontras Chãs d’ Égua. Vai com tempo para ficares largos minutos na descoberta de vestígios de Arte Rupestre. E há paisagens de sonho, trabalhadas pelo Homem, casas, pontes, uma delas suspensa, única. Tudo parece arrumado num tempo que se mantém igual, à excepção das estradas e caminhos por onde se chega mais rápido – estradas e caminhos que a população usou para fugir das leiras, das encostas, dos animais que parece nunca terem existido, e das pedras, das pedras com as quais se construíram casas…cobertas de pedras.
A aldeia é linda para quem continua na viagem com a sensibilidade à flor da pele.
Para voltares a casa basta seguires as “placas”, mas se trouxeres o GPS, nem delas precisas!

Convenci-te com a ideia?
Um abraço, que vai daqui até aí.